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As ações de fiscalização planejada no contexto da regulação responsiva
04/07/2025

Desde a origem, as agências reguladoras no Brasil adotaram, como regra, desenhos regulatórios de cunho preponderantemente coercitivo, conhecido como modelo de comando e controle, caracterizado pelo uso da autoridade e da aplicação de penalidades como instrumentos de conformação do comportamento dos regulados.

Assim, a perspectiva normativo-regulatória se restringe à coação promovida pela mera subsunção dos fatos aos dispositivos previstos na norma, a qual se sustenta por uma presumida relação de causa e efeito entre o comando do regulador e a postura do regulado.

Por outro lado, a Teoria da Regulação Responsiva, idealizada por Ian Ayres e John Braithwaite em 1992, parte do pressuposto de que a efetividade da regulação está condicionada à adoção de regras que incentivem o regulado a cumprir voluntariamente, em um processo dialógico contínuo entre regulador e regulado, mesclando estratégias de persuasão e sanção, fomentando o agir virtuoso dos regulados.

Tal modelo não afasta completamente as sanções, mas as emprega apenas nas situações de desconformidade mais expressivas, em que os compromissos regulatórios são transgredidos de forma mais grave e contumaz. Assim, persuasão e punição são utilizadas conforme o caso que se apresente ao ente regulador, assumindo que ambas as abordagens técnicas se complementam.

Apesar de recomendar a estruturação de uma pirâmide responsiva, a teoria não preconiza um conjunto específico de prescrições, não havendo uma receita pronta para o regulador. Os idealizadores desta perspectiva regulatória entendem que a melhor estratégia está dentro do contexto em que se constrói a regulação, a cultura regulatória previamente estabelecida e o desenrolar histórico em que a regulação se firmou. Portanto, o conceito de responsividade abarca, acima de tudo, a criação de abordagens regulatórias diversificadas.

Nesse contexto, a Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS), por intermédio da Diretoria de Fiscalização (DIFIS), desenvolveu e aperfeiçoou as Ações de Fiscalização Planejada (AFP). Elas podem ser definidas como um conjunto de ações fiscalizatórias de natureza sistematizada, de escalonamento gradativo, com fundamento em princípios da regulação responsiva, sem prejuízo da aplicação de sanções, se necessário, que visam a estimular as operadoras e as administradoras de benefícios ao equacionamento de questões operacionais e processos internos de trabalho potencialmente geradores de infrações, com vista ao aprimoramento dos serviços prestados aos beneficiários e à redução do registro de demandas de reclamação.

Evidencia-se, portanto, que o objetivo primordial das AFP é induzir a adoção de boas práticas pelo mercado regulado, de forma a corrigir e aperfeiçoar processos internos e operacionais, reduzir a assimetria de informação e, consequentemente, diminuir o volume de reclamações, um verdadeiro jogo de ganha-ganha.

Desse modo, as operadoras e as administradoras de benefícios poderão ser enquadradas em uma das modalidades das AFP, quando aplicável, a partir de indicadores que visam ao monitoramento das entradas de reclamações nos canais de atendimento (Painel do IGR), de desempenho insatisfatório em outra modalidade de AFP, ou de fato relevante que demande a atuação da fiscalização para a correção de desvios do setor.

Em vista disso, duas modalidades de AFP desenvolvidas em 2023 e 2024 merecem ser destacadas: as Ações Planejadas Preventivas de Fiscalização (APP) e as Ações Planejadas Focais de Fiscalização (APF). Ao longo desses dois anos, vinte e oito operadoras e administradoras de benefícios foram selecionadas para essas ações, o que representa mais de quinze milhões de beneficiários (média dos últimos três meses), e cerca de 30% do mercado de assistência médica.

A APP é norteada por delineamento teórico atrelado à concepção de regulação responsiva e tem como objetivo informar, instruir e sensibilizar os agentes regulados a respeito de boas práticas no mercado. Corresponde à modalidade de menor complexidade e rito sumaríssimo, envolvendo assuntos específicos e pontuais, aplicável às operadoras/administradoras de benefícios de qualquer porte, que se situam nas posições menos críticas dos rankings de reclamações. A escolha deste público se deve ao fato de que, mediante certas ocorrências, em regra, de natureza assistencial, estes entes regulados podem rapidamente atingir as posições mais gravosas nos monitoramentos. Daí, o caráter preventivo destas ações, para que esses agentes, por meio da autorregulação, se reposicionem nas faixas mais inferiores dos ranqueamentos.

Ao longo de 2024, seis operadoras foram objeto de diligências remotas em sede de APP, sendo que, a partir de resultados preliminares, cinco apresentaram redução no IGR e uma ainda permanece sem melhora no indicador. O período de monitoramento ainda está em curso e, ao final, será aferido se os resultados foram de fato atingidos.

No que tange à APF, o rito é sumário e o grau de complexidade moderado, aplicável às operadoras/administradoras de benefícios de qualquer porte, com classificações mais gravosas nos ranqueamentos de reclamações. Ressalte-se que a APF visa a uma atuação mais direcionada da fiscalização, apontando assuntos focais para que os próprios agentes de mercado precedam a identificação das causas das reclamações recorrentes de beneficiários e adotem medidas de ajuste ou aprimoramento da operação, visando ao aumento da eficiência dos serviços prestados e à redução da entrada de reclamações.

Porém, diferentemente do que ocorre na APP, nas questões apontadas pela Fiscalização na APF, os representantes da operadora devem apresentar um plano para o seu equacionamento, dentro de um prazo determinado. Transcorrido o prazo, deverá apresentar relatório comprobatório do cumprimento das ações propostas, a partir do qual se inicia o monitoramento da evolução do registro das reclamações de beneficiários.

Cumpre registrar que o projeto da APF foi iniciado em 2023, e vinte e duas operadoras/administradoras de benefícios foram objeto de diligências fiscalizatórias. Após resultados preliminares, treze apresentaram redução no IGR, sete ainda não apresentaram redução substancial do IGR, enquanto duas se encontram em processo de saída do mercado.

Assim, tanto a APP quanto a APF vêm se consolidando como instrumentos efetivos para a indução de boas práticas no setor, devendo ser normatizadas e aperfeiçoadas no novo modelo de fiscalização, já que estimulam a correção de falhas, previnem a ocorrência de infrações mais graves, contribuem para a redução do volume de reclamações e para a melhoria da experiência do consumidor, além do fortalecimento da governança interna das operadoras e a sustentabilidade do setor.

Concluindo, esse é o caminho da regulação do futuro: mais responsiva, mais eficiente, mais justa e, sobretudo, mais protetiva ao cidadão.


Fonte: https://monitoring.knewin.com/front/noticia/?k=TVRBMk5UUXdNekl6SmpFMU9EYz0=