Por Giovanni Faria Silva *
Recentemente a hepatite C ganhou destaque nos noticiários, graças à divulgação dos resultados de uma pesquisa do Instituto Nacional de Saúde dos Estados Unidos (NIH) no periódico The Annals of Internal Medicine, os quais constataram que o número de mortes causadas pela doença naquele país já são 12% maiores que as resultantes do HIV, vírus da AIDS.
Mas, qual o grande impacto desta informação para nós brasileiros? Para responder esta pergunta, precisamos fazer algumas considerações.
A primeira delas é que o HCV, vírus causador da hepatite C, infecta cronicamente cerca de 180 milhões de pessoas no mundo, sendo atualmente a principal causa de doença hepática avançada, incluindo o câncer de fígado. A cirrose decorrente deste tipo de hepatite é a causa mais frequente de transplante hepático em adultos (30-50%). No Brasil, de acordo com o Ministério da Saúde, são 1,5 milhão de pessoas infectadas. Estima-se que, assim como nos Estados Unidos, a maioria delas seja de adultos entre 45 e 64 anos, que ignoram estar doentes. Acredita-se ainda que de 30% a 40% dos brasileiros portadores do HIV estejam coinfectados com o vírus da hepatite C, que é seis vezes mais contagioso que o HIV e mata quatro vezes mais do que a AIDS.
Um segundo aspecto é que do ponto de vista clínico, os objetivos primários do tratamento da hepatite C visam reduzir a progressão da doença e prevenir as complicações da mesma. Todavia, se não houver adesão do paciente a este tratamento, as chances de cura são drasticamente reduzidas.
Quando o paciente participa ativamente do tratamento e identifica os efeitos indesejáveis das drogas antivirais empregadas no tratamento da hepatite C, existe a possibilidade de uma rápida intervenção médica no manejo destas reações adversas, favorecendo o alcance da resposta virológica sustentada (cura).
Em um estudo recente realizado com portadores de hepatite C crônica, genótipo 1, obtivemos 52% de cura em pacientes tratados com a terapia padrão (interferona peguilada e ribavirina). A população estudada apresentou uma adesão plena ao tratamento de 92%. Sem dúvida este deve ter sido o fator preponderante nos expressivos resultados de resposta virológica sustentada. Acreditamos que este nível de adesão seja explicado pela abordagem multidisciplinar (enfermagem – nutricionista – psicólogas – médicos) e ao uso das drogas acima mencionadas.
Vale ressaltar que as chances de cura da hepatite C triplicaram a partir da introdução, em outubro de 2011, de um novo padrão de tratamento para a doença: a terapia tripla. Indicada para pacientes portadores do genótipo 1 do HCV que nunca foram tratados ou que não obtiveram sucesso com o tratamento padrão, a terapia tripla é uma combinação do tratamento padrão com um inibidor de protease (boceprevir).
Porém, reforço que também neste caso é extremamente necessária à adesão do paciente. Médicos e pacientes devem ser parceiros, corresponsáveis na escolha e acompanhamento do tratamento. Só desta forma é possível controlar os efeitos adversos das drogas antivirais, evitar o abandono da terapia e contribuir para a redução não só das mortes, mas também, dos gastos públicos com internações e tratamentos por cirrose e câncer de fígado, além de transplantes hepáticos decorrentes da hepatite C.
* Giovanni Faria Silva
Médico Clínico, professor assistente Doutor da disciplina de Gastroenterologia da Faculdade de Medicina de Botucatu (FMB/Unesp); Doutorado pela Faculdade de Ciências Médicas (FCM/Unicamp) e presidente eleito da Associação Paulista para o Estudo do Fígado (APEF).